O primeiro item da NR-05 (CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes) já mostra ao que veio: “A Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA – tem como objetivo a prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho, de modo a tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida e a promoção da saúde do trabalhador”.
Atenção ao seguinte trecho: “tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida”.
É justamente por isso que eu falo frequentemente que a CIPA é o braço direito da Segurança do Trabalho dentro das empresas. Principalmente quando a empresa não possui SESMT, aí esse papel torna-se ainda mais importante. Assim como também é importante o papel do designado de CIPA (quando a empresa não se enquadra no quadro I da NR-05, o empregador indica um designado para ser a “CIPA sozinho”, ou seja, o designado de CIPA).
O benefício da “falsa estabilidade”
Devido à importância que possui a comissão, os ‘cipeiros’ acabam adquirindo alguns benefícios para exercerem seu mandato tranquilamente, de forma que possam trabalhar sem receio de represálias (pelo menos teoricamente).
O mais comentado e conhecido de todos os benefícios é a chamada estabilidade. Infelizmente, muitas empresas não dão a devida importância à CIPA e o único motivo pelo qual os funcionários querem participar é para não serem demitidos no período preconizado pela lei (de acordo com o item 5.8, estabilidade de dois anos: o ano do mandato e o ano seguinte ao mandato).
Só que o mesmo item fala em “dispensa sem justa causa”. Ou seja, o funcionário, mesmo sendo membro da CIPA e gozando da estabilidade, pode ser demitido por justa causa.
Muita gente associa justa causa a alguma falha muito grave, né? Só que não é bem assim que as coisas funcionam. Vejamos o que diz o artigo 482 da CLT:
Art. 482 – Constituem justa causa para rescisão de contrato de trabalho pelo empregador:
a) Ato de improbidade;
b) Incontinência de conduta ou mau procedimento;
c) Negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;
d) Condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena;
e) Desídia no desempenho das respectivas funções;
f) Embriaguez habitual ou em serviço;
g) Violação de segredo da empresa;
h) Ato de indisciplina ou de insubordinação;
i) Abandono de emprego;
j) Ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
k) Ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
l) Prática constante de jogos de azar;
m) Perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
Parágrafo único – Constitui igualmente justa causa para dispensa de empregado a prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios à segurança nacional. (Incluído pelo Decreto-lei nº 3, de 27.1.1966)
Portanto, fica claro que muitas coisas que ocorrem no dia a dia de uma empresa podem ser utilizadas para constituir demissão por justa causa. Logo, se a empresa realmente pretende mandar um funcionário embora (mesmo sendo um ‘cipeiro’) provavelmente ela consegue mandar. É justamente por isso que me refiro à estabilidade do ‘cipeiro’ como “o benefício da falsa estabilidade”. Porque ela existe na teoria, mas como eu costumo dizer, na prática a teoria é outra.
Nas empresas que levam a CIPA a sério existe um outro benefício: o benefício da “autoridade”. Teoricamente, o ‘cipeiro’ tem algum conhecimento em Segurança do Trabalho e pode contribuir positivamente com isso, dentro dos seus setores de trabalho e em outros setores que possam vir a precisar de uma atenção no quesito prevenção.
Quando a CIPA é levada a sério, ela é respeitada pelos colaboradores, pois já existe essa cultura, então, o ‘cipeiro’ acaba assumindo essa responsabilidade e transmitindo a confiança que outros trabalhadores precisam para seguir orientando.
Desta forma, o ‘cipeiro’ torna-se uma referência dentro da empresa e estimula os demais a seguirem o mesmo caminho.
Em muitas empresas grandes e sérias, que cuidam de suas CIPAs, os ‘cipeiros’ informam o mandato no currículo. Visto ser uma experiência positiva e gratificante, utilizam o fato de terem sido ‘cipeiros’ para agregar valor às experiências profissionais elencadas no currículo.
Este gesto é bem visto por profissionais de Recursos Humanos, pois enxergam naquele profissional o senso de comprometimento e responsabilidade que uma CIPA séria exige, e cria um possível diferencial em futuros processos seletivos para outras vagas em outras empresas.
Os deveres dos ‘cipeiros’
Mas, como tudo na vida, nem só de direitos vive o homem e, obviamente, com os cipeiros não seria diferente. Há muitos deveres também, principalmente nas empresas que levam a CIPA a sério.
O item 5.16 da NR-05 traz treze alíneas relacionadas aos deveres da CIPA. O item é intitulado como “atribuições” e deve ser levado em consideração no momento da candidatura do funcionário, visto que ele precisará, junto aos demais membros, dedicar-se a cumprir, PELO MENOS, esses requisitos definidos pela norma.
Logo, precisa conhecê-los para saber se dará conta de desempenhar um trabalho digno diante da comissão, com a seriedade que a mesma requer.
Não vou citar todos os deveres já que estão na norma e podem ser consultados.
Além disso, trata-se de muitos subitens e o mais importante a ser destacado é que todos, TODOS os subitens referentes aos deveres do ‘cipeiro’ estão relacionados à prevenção, Saúde e Segurança no Trabalho, tanto dele quanto dos seus companheiros.
Portanto, como podemos observar, a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes não trata apenas de oferecer estabilidade ao ‘cipeiro’. Isso é apenas um lado da moeda que eu afirmo, frequentemente, ser o lado menos importante.
É sempre válido relembrar que a CIPA tem papel fundamental dentro de qualquer empresa, afinal, todas as organizações possuem suas particularidades relacionadas à saúde dos colaboradores e à segurança no ambiente de trabalho, independente de tamanho ou quantidade de funcionários.
Sugestões para quem se envolve com a CIPA
Se você é ‘cipeiro’, faça seu papel da melhor forma que puder, nas condições que tiver, para atender às expectativas de quem confiou o voto a você, ou, caso tenha sido indicado pelo empregador, dê o seu melhor para atender suas necessidades dentro da comissão interna em prol das melhorias relacionadas à SST dentro do ambiente de trabalho.
Se você é um gestor e tem autonomia e gerência sobre o funcionamento da CIPA na sua empresa, coloque-a para funcionar, ofereça meios e ferramentas para que os ‘cipeiros’ desempenhem seu trabalho dentro da comissão.
Se você é consultor em Segurança do Trabalho e precisa montar e/ou treinar uma CIPA, bata na tecla da sua importância para além dos direitos dos ‘cipeiros’.
Mostre os deveres e os motivos pelos quais eles existem. O profissional de segurança do trabalho sabe melhor do que ninguém a importância de ter uma CIPA ativa, funcionando e alimentando o ciclo PDCA dentro da própria comissão, sempre buscando a melhoria contínua relacionada à saúde e segurança do trabalhador dentro de seu ambiente laboral, afinal, é no trabalho que normalmente passamos a maior parte dos nossos dias, ele precisa ser um lugar seguro e salubre.
E você, tem alguma dica, sugestão ou dúvida relacionada à CIPA? Manda pra cá que a gente se vira nos 30 pra responder.
Um grande abraço e até o próximo artigo!