Vi esta pergunta num grupo de Telegram que faço parte e reparei algumas divergências nas respostas do pessoal. Percebi que muitos daqueles que respondiam estavam se baseando na prática e não na legislação. Como assim?
Conhecimento necessário antes da CAT
Antes de falar sobre abertura de Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) em si, precisamos saber o que a legislação preconiza sobre acidente de trabalho. Para tal, vamos dar uma olhada nos artigos 19, 20 e 21 da lei 8.213/91.
O artigo 19 traz a definição legal de acidente de trabalho, creio que já conhecido pelos profissionais da área. Tem o seguinte texto:
“Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço de empresa ou de empregador doméstico ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.”
Já o artigo 20 merece atenção especial, pois mostra o que é (e o que não é) considerado acidente/doença de trabalho:
“I – doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;
II – doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.
§ 1º Não são consideradas como doença do trabalho:
a) a doença degenerativa;
b) a inerente a grupo etário;
c) a que não produza incapacidade laborativa;
d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.
§ 2º Em caso excepcional, constatando-se que a doença não incluída na relação prevista nos incisos I e II deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la acidente do trabalho”
Por último e não menos importante, o artigo 21 cita acontecimentos que são equiparados a acidente de trabalho. Portanto, também precisamos nos atentar a este artigo. Vejamos:
“I – o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação;
II – o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em consequência de:
a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho;
b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho;
c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho;
d) ato de pessoa privada do uso da razão;
e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior;
III – a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade;
IV – o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:
a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;
b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito;
c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta dentro de seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado;
d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.
§ 1º Nos períodos destinados a refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o empregado é considerado no exercício do trabalho.
§ 2º Não é considerada agravação ou complicação de acidente do trabalho a lesão que, resultante de acidente de outra origem, se associe ou se superponha às consequências do anterior.”
Analisar estes itens da lei 8.213/91 era imprescindível antes de falarmos sobre CAT, afinal, ela comunica justamente a ocorrência do acidente e para comunicá-lo, precisamos saber exatamente o que vamos comunicar.
Visto isso, agora vamos entrar na CAT propriamente dita. Ainda dentro da lei 8.213/91, vejamos o que traz o seu artigo 22:
“A empresa ou o empregador doméstico deverá comunicar o acidente do trabalho à Previdência Social até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência e, em caso de morte, de imediato, à autoridade competente (…)”.
Na prática a teoria é outra
Repara que a lei não faz distinção entre acidente com ou sem afastamento. A lei é muito clara: “comunicar o acidente de trabalho”. E ponto! Como você já leu nos artigos 19, 20 e 21 o que é acidente de trabalho, o que considera-se acidente de trabalho e o que equipara-se a acidente de trabalho, NÃO IMPORTA se teve ou não afastamento. Estando dentro do contexto de acidente de trabalho, ABRE-SE A CAT sim.
O que acontece (e foi por isso que eu escrevi mais acima que NA PRÁTICA A TEORIA É OUTRA) é que a grande maioria das empresas não abre a CAT quando o acidente não gera afastamento e faz isso achando que é uma baita vantagem…
Se alguém me provar que não abrir a CAT para acidentes sem afastamento pode trazer algum benefício para a empresa, eu posso até mudar minha opinião (juro que não tenho problema nenhum em mudar minha opinião sobre algo), mas acho difícil ter argumento para mostrar isso.
Muitos profissionais da área alegam que não abrem a CAT para “não impactar no FAP” da empresa.
Este argumento vai por água abaixo quando temos o mínimo conhecimento de que o FAP apenas será impactado em caso de concessão de benefício acidentário por parte do INSS. E nesses casos, independe se a empresa abre CAT ou não. Quando chega na base de dados do INSS que o colaborador X da empresa Y começou a receber o benefício acidentário Z, não precisa de CAT para este benefício impactar no FAP.
Logo, já temos aqui duas situações distintas:
1) Acidente sem afastamento não gera benefício acidentário. Nada acontece com o FAP.
2) Se o acidente gerar benefício acidentário, não é a CAT que vai impactar no FAP e sim a própria concessão do benefício, visto que o INSS identifica as informações necessárias para gerar a variação do FAP.
Como podemos ver, não faz diferença, com relação a impacto no FAP, abrir CAT para acidente sem afastamento. Mas pode fazer diferença NÃO abrir. Pensando nisso, eu posso trazer dois motivos (dentre vários) para a empresa abrir a CAT mesmo em acidentes sem afastamento. Bora lá:
1) Caso haja uma fiscalização na empresa (por outros motivos, qualquer motivo) e esta fiscalização identificar que a empresa não abriu a CAT para um acidente de trabalho, além da multa prevista na legislação ainda teremos uma outra consequência muito mais onerosa do que a própria multa: definição automática de FAP=2 (caso a empresa não seja do Simples Nacional).
2) Não dá pra garantir sempre que um acidente que não gerou afastamento não vai se agravar. Já vi casos em que um afastamento inicial de oito dias não foi suficiente para o trabalhador estar apto a retornar, havendo agravação da lesão, e o mesmo precisou de mais 21 dias. Problemas à vista, certo? Vai arriscar em troca de nada?
Resumindo…
Perceba que abrir uma CAT, mesmo quando o acidente não gera afastamento, não vai causar prejuízo nenhum. Mas, como já foi dito, NÃO ABRIR pode causar um rombo nos cofres da empresa. E aí, vai arriscar?
Bom, se tiver alguma dúvida com relação a esse assunto, deixa nos comentários que a gente se vira nos trinta pra responder, beleza?
Eu vejo você no próximo artigo.
Um grande abraço a todos e FA LOU!
2 comentários em “Acidente do trabalho SEM afastamento: abre CAT?”
Posso solicitar da empresa uma cópia da CAT para saber se foi aberta uma?
Sim Josemar. Inclusive, de acordo com a Instrução Normativa nº 45/2010, a CAT deve ser emitida em 4 vias, sendo uma delas a via do segurado/acidentado.