As legislações brasileiras sobre Saúde e Segurança do Trabalho – SST existem há um bom tempo. Mas ainda percebe-se que as diferenças entre a Legislação Trabalhista x Previdenciária de SST ainda é um grande motivo de confusão para profissionais da área.
Embora as duas legislações tenham princípios bastante semelhantes e complementares, algumas especificidades na legislação previdenciária e decisões judiciais acabam colocando mais dúvida na cabeça de quem trabalha na área.
Esta confusão ocorre, especialmente, na hora de elaborar os programas , laudos, perícias e no preenchimento do Perfil Profissiográfico (Previdenciário) – PP(P).
Além dos problemas de assertividade, é comum encontrar LTCAT mencionando insalubridade e/ou sem aposentadoria especial e GFIP, LTCAT e PPRA juntos, PP(P) preenchido erroneamente a partir do PPRA, entre outras situações que evidenciam dúvidas sobre a diferença nas legislações.
Para tentar clarear um pouco as diferenças, vamos rever as duas legislações, especialmente aquelas disposições que causam maior confusão.
Legislação Trabalhista de SST
As regras trabalhistas em saúde e segurança do trabalho estão previstas, basicamente, na CLT e regulamentadas nas Normas Regulamentadoras – NRs do MTE.
Atualmente, as NRs já somam 36 e dispõem sobre aspectos sociais, técnicos e setoriais envolvendo a Higiene Ocupacional.
Existe NR que dispõe sobre o trabalho na construção civil(NR-18), outra sobre o trabalho com máquinas e equipamentos(NR-12); tem norma sobre exames e controle médico do trabalhador (NR-7) e normas sobre benefícios que o trabalhador pode ter direito (NR-15 e NR-16) e assim por diante.
E com certeza, uma das mais importantes para a promoção da saúde e segurança no ambiente de trabalho é a NR 9 – PPRA.
O Programa de Prevenção de Riscos Ambientais -PPRA é o principal instrumento de gestão da saúde e segurança ocupacional.
Mas cabe ressaltar que trata-se de um PROGRAMA, e por isso, não deve concluir se os empregados tem este ou aquele benefício, já existem outros instrumentos/documentos próprios para isso.
No PPRA estão presentes os agentes nocivos e fatores de risco aos quais os empregados ficam expostos no ambiente de trabalho. Entretanto, as avaliações qualitativas e quantitativas no PPRA, na maioria das vezes, não possui aspectos técnicos e elementos necessários para o preenchimento do PP(P) com base nele.
Entre as NRs técnicas, as NR 15 – Atividade e Operações Insalubres e NR 16 – Atividade e Operações Perigosas são aquelas que mais confundem-se com as regras previdenciárias de aposentadoria especial.
A NR-15 e seus 14 anexos são a fonte de informação que orientará os profissionais de SST a elaborar laudo técnico para caracterizar se uma determinada atividade é considerada insalubre e, em caso afirmativo, o grau de insalubridade: mínimo(10%), médio(20%) ou máximo(40%).
Já a NR-16 define as atividades ou operações consideradas perigosas e que asseguram ao trabalhador o pagamento de adicional de 30% sobre o salário.
Tanto o benefício da Insalubridade quanto Periculosidade serão constatados por laudo técnico que só pode ser realizado por engenheiros de segurança e médicos do trabalho.
Quando arguida em juízo insalubridade ou periculosidade, seja por empregado ou por Sindicato, o juiz designará perito habilitado para caracterização ou não do direito ao benefício.
Legislação Previdenciária
A nossa legislação previdenciária, desde a década de 60, garante benefício de aposentadoria especial em razão da exposição a agentes nocivos no trabalho. (Confira o artigo sobre aposentadoria especial)
Até o ano de 1995, com exceção ao agente físico ruído, o benefício da aposentadoria especial era devido sem precisar comprovar a efetiva exposição a agentes nocivos.
Bastava ao trabalhador comprovar ter exercido determinadas atividades profissionais e/ou pertencer a uma categoria profissional listada para fazer jus ao benefício.(Confira os Anexos I e II)
A consolidação das regras atuais para a concessão de aposentadoria especial veio na virada do século, com o Decreto 3048/99. Em seu Anexo IV, este decreto traz a relação de agentes nocivos considerados para fins de concessão de aposentadoria especial.
Logo, o empregado que comprove ter trabalhado com exposição habitual e permanente a agentes nocivos listados no Anexo IV, teria direito a aposentadoria após quinze, vinte ou vinte e cinco anos, conforme o caso, de trabalho com exposição a estes agentes.
De acordo com o Art. 68, Decreto 3048/99:
§ 3o A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho
Portanto, o Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho – LTCAT é a fonte oficial da previdência para preenchimento do formulário de comprovação da efetiva exposição que daria direito a aposentadoria especial.
O referido formulário é o famoso Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP, que atualmente é chamado somente de Perfil Profissiográfico – PP.
Sendo assim, o PP é um documento exclusivamente previdenciário e deve ser preenchido segundo as regras que constam no Regulamento da Previdência Social.
LTCAT x Insalubridade
Acabamos de ver que o LTCAT é um documento previdenciário criado para comprovar a exposição a agentes nocivos e preencher o PP para fins de aposentadoria especial.
Já a insalubridade é um benefício trabalhista previsto na Constituição Federal e CLT, sendo regulamentado pela NR-15 do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE.
Por que então boa parte dos documentos de LTCAT, talvez a imensa maioria, apresenta conclusão sobre as atividades insalubres? E por que é raro encontrar LTCAT com conclusão sobre aposentadoria especial e GFIP?
A resposta para estas perguntas é justamente o motivo da produção deste artigo, pois é realmente uma dos maiores confusões na área de saúde e segurança do trabalho.
Um LTCAT deveria concluir apenas se as atividades desenvolvidas pelo trabalhador enquadram-se como especial, de acordo com o Decreto 3048/99, e o respectivo número da GFIP seguindo as orientações abaixo:
(em branco) – Sem exposição a agente nocivo. Trabalhador nunca esteve exposto.
01 – Não exposição a agente nocivo. Trabalhador já esteve exposto.
02 – Exposição a agente nocivo (aposentadoria especial aos 15 anos de trabalho);
03 – Exposição a agente nocivo (aposentadoria especial aos 20 anos de trabalho);
04 – Exposição a agente nocivo (aposentadoria especial aos 25 anos de trabalho).
Para concluir as atividades ou operações insalubres ou periculosas e os respectivos percentuais a serem acrescidos no salário do trabalhador, deve-se elaborar o laudo técnico de insalubridade e periculosidade e não o LTCAT.
Talvez o fato de ambas NR-15 e NR-16 não denominarem este laudo, acabe levando profissionais de SST elaborarem laudos sobre insalubridade e periculosidade com o nome de LTCAT.
O laudo das NR-15 e NR-16 poderia ser chamado de LTIP – Laudo Técnico de Insalubridade e Periculosidade.
As regras de enquadramento e os agentes nocivos que ensejam o benefício da insalubridade distinguem-se um pouco das regras previdenciárias de aposentadoria especial.
Esta é uma das razões para que os laudos LTCAT e LTIP sejam apresentados em documentos diferentes.
É correto preencher o PP com base no PPRA?
Este é um tema polêmico e um tanto controverso.
Grande parte dos profissionais do mundo do trabalho não têm a segurança necessária para assessorar seus clientes no preenchimento do Perfil Profissiográfico com base no PPRA.
Sobre este assunto, a Instrução Normativa nº 77 do INSS traz o seguinte:
Art. 261. Poderão ser aceitos, em substituição ao LTCAT, e ainda de forma complementar, desde que contenham os elementos informativos básicos constitutivos relacionados no art. 262, os seguintes documentos:
V – as demonstrações ambientais:
a) Programa de Prevenção de Riscos Ambientais – PPRA;
b) Programa de Gerenciamento de Riscos – PGR;
c) Programa de Condições e Meio Ambiente de Trabalho na Indústria da Construção – PCMAT; e
d) Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional – PCMSO.
Então, pode sim preencher o PP com base no PPRA e outros programas de SST. Ou não pode?
Uma das exigências para substituir as demonstrações ambientais do LTCAT pelos programas de SST citados é que estes contenham os seguintes elementos informativos:
I – se individual ou coletivo;
II – identificação da empresa;
III – identificação do setor e da função;
IV – descrição da atividade;
V – identificação de agente nocivo capaz de causar dano à saúde e integridade física, arrolado na Legislação Previdenciária;
VI – localização das possíveis fontes geradoras;
VII – via e periodicidade de exposição ao agente nocivo;
VIII – metodologia e procedimentos de avaliação do agente nocivo;
IX – descrição das medidas de controle existentes;
X – conclusão do LTCAT;
XI – assinatura e identificação do médico do trabalho ou engenheiro de segurança; e
XII – data da realização da avaliação ambiental.
Fonte: Art. 262, IN nº 77 do INSS
Você conhece algum PPRA com todos estes elementos? Pois é, realmente são poucos programas que contêm todos elementos básicos exigidos. Ademais, o PPRA não é conclusivo, pois trata-se de um programa e não um laudo.
A outra objeção relacionada ao preenchimento do PP a partir do PPRA é o fato do Decreto 3048/99 mencionar apenas o LTCAT como fonte de preenchimento do PP.
E de acordo com o ordenamento jurídico, um Decreto não poderia ser alterado por uma Instrução Normativa, fato que ocorre na IN nº 77 do INSS segundo alguns especialistas.
Todas empresas devem elaborar LTCAT e LTIP?
Em tempos de eSocial, uma das dúvidas mais evidentes é sobre a obrigatoriedade de elaborar os laudos de SST LTCAT e LTIP.
Afinal, quais empresas precisam elaborar estes laudos?
A resposta para esta pergunta não está explícita em nenhuma legislação, no entanto, analisando os objetivos de cada laudo, podemos chegar a algumas indicações.
Na verdade, se analisarmos mais profundamente o assunto, perceberemos que a resposta mais adequada estará no próprio PPRA da empresa. Isso mesmo, no PPRA!
O LTIP é o laudo que caracterizará atividades e operações insalubres e perigosas. Sendo assim, caso o PPRA reconheça alguma atividade perigosa, de acordo com a NR-16, ou algum risco ambiental previsto na NR-15 em concentração/intensidade/frequência acima do nível de ação, é aconselhável que a empresa elabore um laudo técnico de insalubridade e periculosidade para constatar se algum trabalhador tem direito a estes benefícios.
Da mesma forma, se estiver presente no PPRA algum agente nocivo listado no Anexo IV do Decreto 3048/99 ou agente reconhecidamente carcinogênico para humanos listado no Grupo 1 da LINACH , a empresa deveria elaborar e manter atualizado o LTCAT.
Além disso, é recomendável que o LTCAT seja a fonte de informação oficial das empresas para prestação das informações obrigatórios de SST no eSocial.
Caso contrário, se não for reconhecido através do PPRA nenhum agente nocivo relevante ou atividade perigosa, a empresa poderia elaborar e implementar somente o PPRA. Preferencialmente com elementos contidos no Art. 262, IN nº 77 do INSS.
Mas, não se pode olvidar que os benefícios trabalhistas de insalubridade e periculosidade também são definidos por convenção coletiva ou por decisão judicial. Por isso, não esqueça de consultar o sindicato e um advogado trabalhista.
O importante é a promoção da saúde e segurança no trabalho!
Embora as diferenças nas legislações sejam importantes para conhecimento e gestão de SST nas empresas, não podemos esquecer que são aspectos meramente técnicos.
O que realmente é imprescindível no final das contas, são os esforços diários para implementação uma cultura prevencionista em toda organização.
De nada vale possuir toda documentação em acordo com as regras vigentes, se os trabalhadores continuam adoecendo nos ambientes da empresa.
E esta deve ser a primeira preocupação de cada profissional de SST.
E qual a sua opinião? Conhece bem as regras trabalhistas e previdenciárias de SST? Compartilhe este conteúdo e deixe seu comentário abaixo!