A despeito da flagrante ilegalidade na “Cobertura Previdenciária Estimada” (COPES), também conhecida por “Sistema de Alta Programada”, a Justiça do Trabalho entende que é de responsabilidade do empregador o pagamento do salário após a alta previdenciária, mesmo quando, após avaliação de retorno pelo médico do trabalho, fique evidenciada a incapacidade laboral do empregado.
Esse “sistema” consiste na fixação prévia do termo final do auxílio-doença no momento da concessão do benefício, ou seja, o perito do INSS presume a data que o segurado deverá estar de alta e limita o pagamento do benefício até este momento, não há uma nova avaliação de capacidade.
No período em que o empregado está em gozo de benefício o seu contrato de trabalho fica suspenso, deixando de ser exigido o cumprimento da maioria das obrigações contratuais, em especial o pagamento de salário. Quando acontece a cessação do benefício, essa suspensão é baixada, retornando o empregado para a responsabilidade do empregador, que deve reintegrá-lo de imediato ao posto de trabalho ou encerrar o contrato nos termos da lei. Tanto para fins de reintegração quanto de demissão, o empregado deve passar por exame médico que ateste a sua capacidade, o médico do trabalho elabora o Atestado de Saúde Ocupacional de Retorno.
Muitas são as vezes que o empregador fica diante de uma situação em que o empregado afastado por incapacidade tem alta médica oficial do INSS e o médico do trabalho não atesta a sua alta para que possa retornar as funções. Assim, a empresa não recebe o empregado por considera-lo inapto e o INSS não paga mais benefício por considera-lo apto, nasce o “Limbo Jurídico Trabalhista-Previdenciário”.
Os Tribunais do Trabalho concluíram que é do empregador o ônus desse “limbo”, isso a partir de uma conjugação de princípios constitucionais e específicos do direito do trabalho, destacando-se dentre eles o princípio da adaptação do trabalho à capacidade do trabalhador, da proteção à saúde e meio ambiente laboral, dignidade da pessoa humana e valor social do trabalho humano.
Além disso, também lançam mão dos princípios da função social da empresa e da função social do contrato, bem como dos princípios da boa-fé objetiva e da não discriminação, aliados à teoria do risco e da responsabilidade social.
Diante deste entendimento, a empresa que não concordar com a alta médica do INSS deve colocar o trabalhador em licença remunerada e insurgir-se contra a decisão do INSS.
Em que pese a presunção de veracidade da alta concedida pelo INSS, é sabido que muitas vezes a cessação do benefício é feita de maneira precoce e, portanto, ilegal.
Basta uma simples pesquisa nas Justiças Federais para constatar o volume de ações movidas pelos segurados contra o INSS visando a declaração de ilegalidade da alta e restabelecimento do benefício.
De outro lado, sabemos que existem inúmeros casos de ação regressiva do INSS para reaver das empresas os valores pagos a título de Auxílio-Doença, comprovando que a incapacidade laboral se deu por culpa do empregador, mas a recíproca não é verdadeira, pois nada se encontra sobre a Ação Regressiva Reversa, isto é, quando a empresa se insurge contra o pagamento de salários no período de “limbo”.
Alguns juristas já aventaram a possibilidade de propositura de medida jurídica para desconstituir a presunção de veracidade da alta conferida pelo INSS, como por exemplo ocorreu na decisão proferida pelo TRT da 2ª Região, nos autos do Recurso Ordinário nº 0003041-87.2013.5.02.0373, de relatoria da Desembargadora Ivani Contini Bramante.
No referido julgado, onde se discutia a responsabilidade do empregador por um funcionário em situação de “limbo”, a turma propôs que: “Se a empresa não concorda com a alta médica previdenciária do trabalhador deve recorrer da decisão da autarquia previdenciária e, destruir a presunção de capacidade atestada pelo médico oficial e fazer valer a posição do seu médico”.
Evidentemente, que os desembargadores se referiam mais à possibilidade de recurso administrativo contra as decisões do INSS, conforme previsto no art. 126 da Lei nº 8.213/91.
Ocorre que, na prática, a adoção deste tipo de procedimento nos remete a duas situações que o inviabilizam: i) o Conselho de Recursos da Previdência Social geralmente mantém as decisões da Perícia Médica do INSS; e ii) a demora na tramitação do processo administrativo.
Diante disso, a própria Desembargadora Ivani Bramanti supracitada já recomendou em suas exposições a possibilidade de o empregador, inconformado com o procedimento do INSS, iniciar uma ação judicial para desconstituir a alta médica indevida e, ainda, requerer a reparação por perdas e danos, a vista do pagamento dos salários durante a licença remunerada.
Assim, fazendo uma leitura contrario sensu, a empresa possui interesse processual e legitimidade para se opor ao ato administrativo manifestamente ilegal que lhe acarreta prejuízos financeiros (pagamento de licença remunerada decorrente de incapacidade laborativa), sendo possível a propositura de ação regressiva contra o INSS para reaver a título de perdas e danos o valor da remuneração paga ao empregado que recebeu indevidamente a alta oficial do INSS e foi equivocadamente considerado apto para o retorno ao mercado de trabalho.
É, portanto, facilmente demonstrável a existência do ato ilícito praticado pela autarquia-previdenciária, do dano (prejuízo financeiro) e do nexo de causalidade.