Em março foi publicado a Nova Norma Regulamentadora (NR) 01 – Disposições Gerais e Gerenciamentos de Riscos Ocupacionais e que entrará em vigência em março de 2021. E a expectativa da publicação dela era muito grande – profissionais prevencionistas aguardavam ansiosamente desde o final do ano passado, após o fechamento do texto pela CTPP.
E muito se tem comentado à respeito da Nova NR 01, pois acredita-se que ela irá mudar a forma como a Saúde e Segurança do Trabalho (SST) acontece no país. Ou seja, que ela irá ter a importância devida e, assim, reduzir os elevados índices de acidentalidade do Brasil e os respectivos impactos atrelados a estes eventos.
Mas, não acredito que apenas uma NR irá mudar o comportamento e a visão atual que muitas empresas, profissionais e consultorias de SST têm da área.
Visão de SST Tradicional
A área de SST é conhecida pela sua atuação frente às necessidades de cumprimento de dispositivos legais, principalmente as NRs, para a proteção da saúde e integridade física dos trabalhadores. E isso gera uma percepção de obrigação, no sentido de obrigatoriedade. E por isso é comum ouvirmos “Por que isso precisa ser feito? Porque é obrigatório, está na NR”.
E, para mim, esse é o principal motivo da área de SST não ser tratada com a devida importância dentro das empresas. Já que as lideranças não veem sentido numa atuação apenas para cumprir dispositivos legais frente aos resultados e objetivos da organização como um todo.
Desta forma, precisamos quebrar este paradigma e mostrar às empresas e clientes que com o nosso trabalho podemos fazer muito mais pelos resultados e sustentabilidade da organização do que apenas cumprir dispositivos legais.
Pois, o cumprimento de uma lei, regulamento ou norma não deve ser o ponto de chegada (finalidade), e sim o ponto de partida (um norte) para uma atuação voltada à solução e resultados.
Em resumo, atualmente temos uma “fábrica de papéis” e que não colaboram muito com a promoção de ambientes seguros e saudáveis e, consequentemente, com a prevenção de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho.
Tanto que, conforme dados do Observatório de SST, os números de 2018 são:
- 623.786 acidentes de trabalho
- 2.022 acidentes de trabalho com óbito
- 154.812 auxílio-doença acidentário (B91)
- 7.503 aposentadoria por invalidez acidentária (B92)
- 231 pensão por morte por acidente de trabalho (B93)
- 15.120 auxílio-acidente por acidente de trabalho (B94)
E por trás destes números alarmantes estão os impactos à sociedade.
Impactos à sociedade
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o impacto econômico dos acidentes de trabalho e doenças relacionados ao trabalho é de aproximadamente 3,94% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial ao ano.
Portanto, levando em consideração que o PIB do Brasil em 2019 foi de 7,3 trilhões de reais (IBGE, 2020), o custo para o país com a acidentalidade é de aproximadamente 280 bilhões de reais por ano.
E se levarmos em consideração apenas a concessão dos benefícios acidentários (B91, B92, B93 e B94) pela Previdência Social, concedidos em 2018, a despesa para o Governo foi de aproximadamente 11,9 bilhões de reais.
Mas ainda há outros impactos ao Governo, trabalhadores e empresas, como destacados abaixo:
Governo:
- Pagamento de benefícios assistenciais
- Despesas com o SUS
- Despesas com o Corpo de Bombeiros/SAMU
- Despesas administrativas e com profissionais (SIT, Fundacentro, CEREST)
Empresas:
- Aumento da contribuição do Seguro contra Acidentes de Trabalho (FAP)
- Despesas médicas
- Custos com ações judiciais, indenizações e ações regressivas
- Pagamento do salário nos primeiros 15 dias de atestado
- Custos com contratação e treinamento para substituição
- Custos com horas extras
- Comprometimento da qualidade do produto ou da prestação de serviços
- Contribuição do FGTS enquanto o trabalhador estiver afastado
- Redução da produção
- Atraso das entregas
- Paradas de máquinas, equipamentos ou processos
- Imagem reputação da empresa
Trabalhadores:
- Redução da remuneração
- Despesas com medicamentos
- Redução temporária ou permanente da capacidade biomecânica e/ou
- cognitiva
- Interferência na vida familiar e convívio social
Desta forma, percebe-se que a visão tradicional de SST, voltada ao cumprimento de NRs tornou-se um processo análogo a um cartório, ou seja, uma “fábrica de papéis”. E que não vem contribuindo para a promoção de ambientes mais seguros e saudáveis.
Desta forma, a Nova NR 01 não irá mudar este cenário se nós não mudarmos nossa visão de SST e consequentemente influenciarmos a mudança do comportamento das lideranças das empresas.
Visão de SST Business
Visão de SST Business é a visão voltada ao resultado (desempenho). E a principal finalidade da área de SST é promover ambientes de trabalho seguros e saudáveis, com elevado grau de confiabilidade e segurança.
Sendo que segurança é “um estado de baixa probabilidade de ocorrência de eventos que provocam danos e perdas”. (Cardella, 2009).
E, para isso, precisamos usar como parâmetro não os dispositivos legais e sim como os acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, bem como os riscos ocupacionais influenciam nos resultados e na sustentabilidade de uma empresa.
Quando compreendermos esta relação, certamente nosso trabalho ficará mais facilitado e surtirá mais efeito, já que teremos apoio das lideranças da empresa e certamente a área de SST será estratégica dentro da organização.
E uma área de SST estratégica é benéfica à toda a sociedade e não apenas às empresas, como vimos no item Impactos à sociedade.
E neste sentido, a NR 01 pode ser uma excelente ferramenta na promoção de ambientes seguros e saudáveis, beneficiando empresas, trabalhadores e Governo – sociedade em geral.
O que irá determinar é a forma como ela será utilizada: para cumprir um dispositivo legal (Burocracia) ou para a melhoria do desempenho de SST (Resultado).
Pois, o cumprimento de uma lei, regulamento ou norma não deve ser o ponto de chegada (finalidade), e sim o ponto de partida (um norte) para uma atuação voltada à solução e resultados.
Desta forma, a NR 01 e o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) deve ser usado como uma bússola, um norte para a melhoria do desempenho de SST, por meio da:
- Gestão de riscos
- Gestão de eventos adversos
- Gestão da saúde dos trabalhadores